Por Expedito Moraes.
Na edição de hoje, peço vênia
aos nossos leitores para reproduzir uma primorosa crônica da lavra de Expedito
Moraes, administrador e baixadeiro natural de Cajari. A
deferência se justifica em razão da aura sentimental de que se reveste o tema
abordado. Assim, para o nosso deleite, passemos à leitura do bucólico texto:
aos nossos leitores para reproduzir uma primorosa crônica da lavra de Expedito
Moraes, administrador e baixadeiro natural de Cajari. A
deferência se justifica em razão da aura sentimental de que se reveste o tema
abordado. Assim, para o nosso deleite, passemos à leitura do bucólico texto:
“Todo dia Dona Antônia acorda cedo e procura alguma coisa pra fazer
o “café” da família. Dona Tunica, como é conhecida, se abastece no
povoado mais próximo, na quitanda do Seu Teodoro, com o dinheirinho do Bolsa Família.
Além de ser muito pouco, Seu Teo vende tudo muito caro. Mas é o único
quitandeiro do povoado. Bem surtido, é abastecido pelos caminhões dos Armazéns
Peixoto e Martins e por outros fornecedores alienígenas. Nada, nada mesmo é
produzido neste Maranhão de um potencial tão rico.
o “café” da família. Dona Tunica, como é conhecida, se abastece no
povoado mais próximo, na quitanda do Seu Teodoro, com o dinheirinho do Bolsa Família.
Além de ser muito pouco, Seu Teo vende tudo muito caro. Mas é o único
quitandeiro do povoado. Bem surtido, é abastecido pelos caminhões dos Armazéns
Peixoto e Martins e por outros fornecedores alienígenas. Nada, nada mesmo é
produzido neste Maranhão de um potencial tão rico.
Tem uma bancada dentro do seu
comércio, que chama de frutaria, e lá se encontram laranjas, bananas,
melancias, mangas, maçãs, tanjas, atas e outras frutas que vêm da Bahia, Ceará,
Paraíba, Pernambuco, São Paulo etc. Até o quiabo, maxixe, cheiro verde, vinagreira,
joão-gomes. Na Ceasa, 98% dos
produtos vem de fora do nosso estado. Seu Teo está bem sucedido, afinal ele é a
ponta de um perverso e quase imperceptível sistema de transferência de renda
dos estados não produtores para os produtores.
comércio, que chama de frutaria, e lá se encontram laranjas, bananas,
melancias, mangas, maçãs, tanjas, atas e outras frutas que vêm da Bahia, Ceará,
Paraíba, Pernambuco, São Paulo etc. Até o quiabo, maxixe, cheiro verde, vinagreira,
joão-gomes. Na Ceasa, 98% dos
produtos vem de fora do nosso estado. Seu Teo está bem sucedido, afinal ele é a
ponta de um perverso e quase imperceptível sistema de transferência de renda
dos estados não produtores para os produtores.
As crianças, todas as manhãs,
precisam percorrer o caminho que atravessa o campo, agora muito seco e cheio de
torrões. Descalças, andam uma légua até a escola municipal. Chegam com o suor
escorrendo pelo rosto misturado com a poeira e mortos de sede. No caminho não
tem água em lugar nenhum. Apenas um pequeno açude, escavado pelo prefeito
anterior, resiste até a seca virar tragédia. Mesmo assim é onde os animais
bebem e são lavados, as pessoas banham, lavam e recolhem água para consumo
doméstico. Essas crianças desnutridas alimentam a esperança de saciar sua fome
com a “merenda escolar”.
precisam percorrer o caminho que atravessa o campo, agora muito seco e cheio de
torrões. Descalças, andam uma légua até a escola municipal. Chegam com o suor
escorrendo pelo rosto misturado com a poeira e mortos de sede. No caminho não
tem água em lugar nenhum. Apenas um pequeno açude, escavado pelo prefeito
anterior, resiste até a seca virar tragédia. Mesmo assim é onde os animais
bebem e são lavados, as pessoas banham, lavam e recolhem água para consumo
doméstico. Essas crianças desnutridas alimentam a esperança de saciar sua fome
com a “merenda escolar”.
Com a aflição da pobreza, Dona
Tunica se desespera. Sem comida em casa, sem água para suas necessidades, para molhar as plantas e o
seu “canteiro”. Da pequena
roça, plantada num pedacinho de terra que sobrou do lado de fora da cerca
eletrificada do fazendeiro, morreu tudo por causa da escassez de chuvas. O
poção mais próximo que dava uns tamatazinhos e umas taririnhas secou. Seu
Chico, marido de Tunica, não sabe mais o que fazer, apesar de no inverno pegar
sua canoa e “empurá-la à vara” até o meio do campo para, com um puçá
ou uma tarrafa, pegar o “cumê” da semana em poucos minutos.
Tunica se desespera. Sem comida em casa, sem água para suas necessidades, para molhar as plantas e o
seu “canteiro”. Da pequena
roça, plantada num pedacinho de terra que sobrou do lado de fora da cerca
eletrificada do fazendeiro, morreu tudo por causa da escassez de chuvas. O
poção mais próximo que dava uns tamatazinhos e umas taririnhas secou. Seu
Chico, marido de Tunica, não sabe mais o que fazer, apesar de no inverno pegar
sua canoa e “empurá-la à vara” até o meio do campo para, com um puçá
ou uma tarrafa, pegar o “cumê” da semana em poucos minutos.
Famílias como a de Chico e
Tunica existem aos montes nos campos da Baixada. São famílias quase nômades,
que no inverno vão pro “Teso”, para onde levam as criações, a fim de que não morram afogadas
nas enchentes ou atoladas na lama, visto que o
pasto fica submerso nas abundantes águas que recobrem os campos. Ali
constroem ranchos cobertos e tapados de pindoba, giral de assoalho de rachas de
palmeira ou marajá, portas e janelas de meançabas. Tudo é improvisado. Mais
tarde será descartado, vai virar “tapera” assim que começar o
“abaixamento”. Logo estarão em algum lugar perto de uma
“baixa”.
Tunica existem aos montes nos campos da Baixada. São famílias quase nômades,
que no inverno vão pro “Teso”, para onde levam as criações, a fim de que não morram afogadas
nas enchentes ou atoladas na lama, visto que o
pasto fica submerso nas abundantes águas que recobrem os campos. Ali
constroem ranchos cobertos e tapados de pindoba, giral de assoalho de rachas de
palmeira ou marajá, portas e janelas de meançabas. Tudo é improvisado. Mais
tarde será descartado, vai virar “tapera” assim que começar o
“abaixamento”. Logo estarão em algum lugar perto de uma
“baixa”.
Esta crônica parece uma obra
de ficção, mas não é. É uma dura realidade. Somente os baixadeiros genuínos conhecem
esse infortínio anual. Por isso, acreditamos que os planos, projetos e ações
reivindicados pelo FÓRUM DA BAIXADA são capazes de reverter essa penúria e
proporcionar melhoria de vida pra mais de meio milhão de pessoas.”
de ficção, mas não é. É uma dura realidade. Somente os baixadeiros genuínos conhecem
esse infortínio anual. Por isso, acreditamos que os planos, projetos e ações
reivindicados pelo FÓRUM DA BAIXADA são capazes de reverter essa penúria e
proporcionar melhoria de vida pra mais de meio milhão de pessoas.”