Inelegibilidade e contas de gestão de prefeitos

                       Flávio
Braga
Uma das inovações mais virtuosas trazidas
pela Lei da Ficha Limpa atingiu em cheio os prefeitos municipais que tiverem
contas de gestão desaprovadas diretamente pelo Tribunal de Contas do Estado. A previsão está agasalhada na nova redação dada à
controvertida alínea “g”, inciso I, do artigo 1º da Lei das Inelegibilidades,
que manda aplicar o disposto no artigo 71, inciso II, da Constituição Federal,
a todos os ordenadores de despesas, sem exclusão de mandatários (gestores) que
houverem agido nessa condição. Por óbvio, todo prefeito detém a condição de
mandatário e de administrador público.
Com efeito, a temida alínea “g” da Lei das Inelegibilidades preconiza
que são inelegíveis, por oito anos, aqueles que tiverem suas contas públicas
rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa e por decisão irrecorrível do órgão competente (tribunal
de contas ou casa legislativa).
Consoante lição extraída do artigo “O caso do prefeito ordenador de despesas”,
de autoria do Professor Caldas Furtado (Conselheiro do TCE/MA), existem dois
regimes jurídicos de contas públicas:
a) o que abrange as denominadas contas de governo, exclusivo
para a gestão política do chefe do Poder Executivo, que prevê o julgamento político levado a efeito
pelo Parlamento, mediante auxílio do Tribunal de Contas, que emitirá apenas um parecer
prévio
.
b) o que alcança as intituladas contas de gestão dos
administradores de recursos públicos, que impõe o julgamento técnico realizado em caráter definitivo pela Corte de
Contas, consubstanciado em um acórdão.
Em suma, para os atos de governo do
prefeito, deve haver o julgamento político; para os atos de gestão do prefeito,
o julgamento técnico. Assim, de acordo com a nova legislação, quando o prefeito
atuar como ordenador de despesas, o próprio TCE julgará definitivamente as suas
contas de gestão, sem necessidade de submeter essa decisão ao julgamento
político da câmara de vereadores.
Sucede
que a Justiça Eleitoral, durante muito tempo, não aceitou o julgamento técnico
prolatado pelas Cortes de Contas, por considerar irrelevante a distinção entre contas de governo
(execução orçamentária) e contas de gestão (ordenação de despesas). Nessa linha, os tribunais de contas só poderiam julgar
prefeitos quando se tratasse da aplicação de recursos repassados mediante
convênios.
Entretanto,
a jurisprudência mais recente do TSE evoluiu (no julgamento do Recurso
Ordinário nº 401-37, em 26.08.2014)  para
reconhecer que os atos do prefeito como ordenador de despesas são passíveis de
juízo de legalidade e de julgamento pelo tribunal de contas e, por isso, não
dependem de apreciação política do Parlamento Municipal.
A conseqüência prática dessa
evolução jurisprudencial é que no pleito de 
2016 haverá um aumento gigantesco no contingente de ex-prefeitos
incursos na causa de inelegibilidade em apreço, visto que não poderão mais
contar com a indulgência providencial das Câmaras Municipais.

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